domingo, fevereiro 24

O meu feijão



Que saudades dos tempos em que a minha avó cozinhava feijão no fogão! Aquele cheiro de feijão catarino, ou manteiga quentinho! A estalar na mão! Assopro a mão, como se estivesse a sentir, ainda, na mão, o quente feijão.
Rebusquei na memória, o dia em que quis ter um bebé!
Tão simples como comer feijão!
A minha mãe trabalhava num consultório, onde havia oito especialidades clínicas diferentes, entre elas, ginecologia.
Um dia perguntei a uma senhora que tinha a barriga muito grande:
- O que é que a Sra. tem?
- Comi muito feijão!
Porque é que os adultos sempre acham que as crianças não pensam? Não sei!
Sei que vi, uns tempos depois, a senhora de barriga vazia, e com um bebé ao colo. Assimilei! Comeu feijões…
Eu também quero ter um bebé. Acabavam-se as desilusões de ter as bonecas que falam e andam, como na televisão e, quando vêm para mim, não!
Sábado à noite, dia da semana sempre romântico, ia dormir a casa da avó. Vou ter um bebé!
- Avó?
- Sim, Nininha!
- Fazes feijão amanhã de manhã?
- Não estava a pensar nisso, mas queres? A avó faz!
Pulava de alegria! Ia ter um bebé! Vou comer feijão! Tanta excitação que quase não dormi!
Quando acordei, senti no primeiro andar, o cheiro de feijão cozido, acabadinho de fazer na cozinha! Pulei da cama, voei escadas abaixo, com ar maroto de quem não conta o segredo, preparei-me para a minha primeira "injeção" de comer feijões de enfiada!
- Está quieta! Estão quentes! Deixa arrefecer!
Mas eu queria tanto um bebé, que pensei que quanto mais cedo e rápido os comesse mais cedo teria o meu presente! Tive que disfarçar, fui-me lavar e vestir, tomar o pequeno-almoço, tudo muito devagar.
- Despacha-te! Que eu vou ao pão e, deixo-te em casa!
Isso é o que ela queria! Eu queria-a dali para fora, para lhe ir ao feijão! Lentamente continuei…
- Pronto! Vou-me embora! Quando saíres fecha a porta!
Felicidade! Quantas letras têm? Não sei! Mas naquele momento, senti cada letra percorrer-me toda! Estava feliz!
Comi todos até rebentar, ficar maldisposta, e gaseada. Era por uma boa causa! Afinal, eu ia ter um bebé. E tudo o que é bom, merece um sacrifício pequeno. Bem grande! Mas estava toda contente!
Final da semana, outro sábado e a barriga nada! Volto a pensar na minha tarefa!
 - Avó? Vais cozer feijão?
 - Não! Vou fazer batata frita para o almoço!
- Faz feijão!
- Não! Ainda me vais explicar o que foi que fizeste ao feijão a semana passada!
Bolas! Pirei-me! Fugi, estava cheia de sono, não estava com tempo para conversas, antes dormir que lhe contar!
Fui-me deitar, a pensar que se calhar já não ia ter o bebé, não perguntei quantos feijões tinha de comer! A primeira desilusão.
Mas nesse fim-de-semana, a minha mãe fez feijão! Não comi foi tanto, porque ela não me deixou. Era para a sopa. Esta gente adulta é assim, tem sempre uma razão para tudo.
E, a barriga nada de crescer, nem um bocadinho. Mostrava e perguntava a toda a gente se achava que eu tinha uma barriga grande. Todos se riam, eu nunca fui cheinha, era sempre a cobaia dos laboratórios quando tinham no mercado um novo produto para engordar.
Eu insistia no feijão. Insisti e insisti. Até que voltei a ver a senhora do feijão. Fui-me a ela, toda zangada, e perguntei-lhe de onde tinha ela recebido o bebé?
- Veio de avião!
Bolas! Andei eu a comer feijão…

(Matilde Rosa)

1 comentário:

  1. kim,
    Que Saudades Sinto de Ti!!!

    https://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=ohtCKeNuiI8

    Canção retirada do álbum "De Pequenino se Torce o Destino" de 1976 por Sérgio Godinho.

    Mandei-lhe uma carta em papel perfumado
    e com letra bonita eu disse, ela tinha
    um sorriso luminoso tão triste tão gaiato
    como o sol de Novembro brincando de artista
    nas acácias floridas, na fímbria do mar

    Sua pele macia era sumauma
    sua pele macia, cheirando a rosas
    seus seios laranja, laranja do Loje
    eu mandei-lhe essa carta
    e ela não disse que não

    Mandei-lhe um cartão
    que o amigo maninho tipografou
    "por ti sofre o meu coração"
    num canto "sim", noutro canto "não"
    e ela o canto do "não" dobrou

    Mandei-lhe um recado pela Zefa do sete
    pedindo e rogando de joelhos na chão
    pela Senhora do Cabo, pela Sta Efigénia
    me desse a ventura do seu namoro
    e ela disse que não

    Mandei à Vó Xica, quimbanda da fama
    a areia da marca que o seu pé deixou
    para que fizesse um feitiço bem forte e seguro
    e dele nascesse um amor como o meu
    e o feitiço falhou

    Andei barbado, sujo e descalço
    como um monangamba procuraram por mim
    não viu, não viu, não viu o Benjamim
    e perdido me deram no morro da Samba

    Para me distrair levaram-me ao baile
    do Sr. Januário, mas ela lá estava
    num canto a rir, contando o meu caso
    às moças mais lindas do bairro operário

    Tocaram a rumba e dancei com ela
    e num passo maluco voamos na sala
    qual uma estrela riscando o céu
    e a malta gritou: "Aí Benjamim!"

    Olheia nos olhos, sorriu para mim
    pedi-lhe um beijo, la la la la la
    e ela disse que sim
    e ela disse que sim
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