quinta-feira, janeiro 30

FUTURO IMPALPÁVEL



Ontem, entraste na minha vida e mudaste tudo. Do caos negro e triste que era o fundo do poço onde eu sobrevivia a custo, já sem forças para escavar uma saída e muito menos para me içar à borda do abismo, trouxeste a já perdida alegria e fizeste renascer esperança. Deste-me as duas mãos, não só uma, quando eu mais precisava de uma luz de futuro. Eu estava perdido num deserto sem caminho e chegaste, qual oásis de frescura, para me ensinar o caminho para a vida em que eu já descria, que não me interessava, totalmente entregue ao que se me configurava o inevitável fim.
Foram tardes de um perene encantamento, aquelas. Tu chegavas com vontade de me dares um pouco da tua e eu recebia-a ávido de me dar e receber. E dessa troca de vida, eu fiz sonho, feito poesia, escrevi-te e escrevi-me em milhares de textos que eram nossos, como os filhos que nunca teremos. Tu eras a musa e eu, o verbo, tu eras a inspiração e eu escrevia à luz dos teus olhos negros e imensos.
Hoje, tudo mudou, percebi que era só sonho, não tinhas nada de palpável para me dar, ou eu nunca descobri o caminho para ti. Trazias um futuro que eu não conhecia, feito de outras vidas e que não podíamos tomar nas mãos, porque só pertencia ao etéreo, a um Deus que nunca tive. Tentei agarrar essa esperança, ah como eu tentei! Não consegui, nunca conseguirei perceber esse teu mundo de renúncia consentida. Mas não baixei os braços, tentei enquanto senti ser possível, haver um futuro para nós.
Mas não havia, cada vez nos separávamos mais. Eu, que acredito na utopia coletiva, não fui capaz de investir na nossa. Perdi-te, ou perdemo-nos, a culpa só pode ser dos dois, não morre solteira. Perdi-me de ti neste longo caminho que foi a nossa relação, cada dia mais distante. Sei o que faltou, provavelmente a culpa foi minha, consegui tocar-te o coração, mas não logrei acender-te o corpo, foi falta minha que continues a pensar erradamente que todos os homens são iguais.
Cresci durante este tempo. Percebi que não havia poço, nem escuro, nem medos, tudo isso está dentro de nós e é muito fácil de vencer, basta querer e eu quero. Nunca mais vou afundar-me em incertezas e isso, devo-o a ti. Isso e a minha obra, a grande facilidade, com que agora me sei escrever e entender.
Hoje sou outro, porque tu existes. Obrigado.

- j a g – 26/01/2014

terça-feira, janeiro 28

In ARRUMADOR DE PALAVRAS «O Livro»



Não é fácil escrever por encomenda, podem crer, pelo menos para mim é muito difícil. Eu tento escrever o menos possível com a cabeça e recorrer mais aos sentimentos. A escrita intelectual que se baseia em maneiras de pensar definidas, cada vez me aborrece mais, talvez por isso tenha deixado de me interessar a política, a racionalidade, (se a nossa o é).

Por encomenda

Gosto de escrever sem destino, encadear umas palavras nas outras sem um propósito definido e esperar para ver.
Mas pediram-me para escrever sobre Alter e o concelho, falar dos monumentos, fazer poesia, (a que eu sou um pouco avesso).
Vivi quatro anos da minha vida em Alter. Foram bons, poderia dizer como o outro, fui feliz em Alter. Não estudei muito, por decisão minha talvez, sempre fui um aluno de suficiente. Lembro de no último dia de aulas ter despachado todos os livros do 5º ano pelas janelas da “carrinha”.
Conheci pessoas de quem ainda hoje guardo grata recordação; Dona Mabília, o Padre Zé Maria, seu Vitorino, gostava do professor Zé Manel Cary, um homem frontal.
E colegas, uns de quem nunca mais ouvi falar, outros que continuaram comigo, ou que reencontrei agora.
Há dias li por aqui a Lenda dos Doze Melhores de Alter, que não conhecia. Fiquei a pensar no nobre que matou homens honrados que defendiam as suas terras, só teve por castigo, que eu diria prémio, refugiar-se em Espanha. Pensei em Camões e no desconcerto do mundo, “Fui mau, mas fui castigado, assim que, só pera mim, anda o Mundo concertado”.
O Castelo de Alter é bonito, moderno, já na data da construção não se deviam sentir grandes necessidades de defesa do território. Só lá entrei uma vez, há muitos anos, talvez trinta e oito e nunca mais lá vou voltar. Estes monumentos que perduram no tempo não nos transmitem a ideia do efémero que tanto nos atrai. Está ali, um dia vamos lá, vai-se adiando.
Eu também não sou muito de me encantar com pedras, seduz-me, isso sim, imaginar as pessoas que passaram pelos lugares; como pensavam, a sua visão do mundo, ou como imaginavam o futuro.
E o Castelo de Alter, sem ter a figura do Sr. Bola-a-bola á porta, não deve ser a mesma coisa.

quarta-feira, janeiro 22

In ARRUMADOR DE PALAVRAS «O Livro»



Aqui está bem patente a minha ânsia de espaço, de liberdade. A minha vontade muitas vezes presente nos meus poemas de galgar o mar.

Asas

Nós devíamos ter asas, meu amor
Para voar como o livre albatroz,
Montar as correntes ascendentes
E planar por todo este imenso céu.

Nós devíamos ter asas, meu amor
Poder abrir as nossas poderosas asas
Vencer todas as barreiras impostas
Concretizar o desejo de estar próximo.

Nós devíamos ter asas, meu amor
Dar umas asas aos nossos sonhos
Viver d’outra maneira, como queremos
Sem precisar de um mundo imaginado.

Nós devíamos ter asas, meu amor
Não só as que tão bem sabemos usar
Mas asas físicas, como as aves.

terça-feira, janeiro 21

In ARRUMADOR DE PALAVRAS «O Livro»



Não sou muito constante nos temas que escrevo. Começo com muita vontade com um assunto ou forma mas rapidamente outra ideia surge e eu largo a antiga e parto pra outra. Será assim com estas Crónicas de Despertar? Veremos…

Crónica de Despertar I

Acordo devagar como quem já tem o sono em dia. Abro os olhos e situo-me, identifico o meu espaço. Perscruto as frinchas dos cortinados, já não é noite; constato. O dia está nascendo.
A julgar pela luz, parece estar muito frio, nesta primavera gelada e seca; aconchego-me.
Regra geral sinto-me fresco. Como não sonho muito, a mente depois do sono está lúcida.
Quando me sinto mais desperto e não naquela modorra entre o sono e a vigília, agarro a madrugada e escrevo.
Escrevo de memória, não tenho outra maneira. As ideias chegam, eu moldo-as, arrumo as palavras como sei e memorizo.
Repito muitas vezes as frases, é um processo demorado, não me posso esquecer de uma única palavra.
Com a seguinte ideia faço o mesmo, o mesmo trabalho. Quando termina, volto a dizer tudo para mim, desde o princípio.
É assim que construo as minhas crónicas de despertar, que têm que ser necessariamente curtas.
De manhã, abro o computador e a torneira da minha memória jorra o texto acumulado. Faço algumas correções, burilo e se gosto guardo.
Nascem assim as minhas “Crónicas de Despertar”.

segunda-feira, janeiro 20

In ARRUMADOR DE PALAVRAS «O Livro»



Normalmente os meus textos com títulos numéricos, referem-se a aniversário, é este o caso.

36

“sou um pedaço de mágoa e uma medida de perdão”

Não sei…
É escasso o tempo para avaliar,
muito curto o convívio e esparso.

Não sei das mágoas, nem do perdão.
O passado foi-se, só o hoje existe, o lugar onde vivemos.

Do pouco que me foi dado ver, gostei muito.
Principalmente dos belos olhos, olhos sinceros.

Confio na minha intuição, que raramente me engana.
Não preciso pagar pra ver, jogo no escuro e ganho.