domingo, março 31

Em busca de vida



Pablo Neruda escreveu, “Confesso que vivi”, eu poderia dizer ou escrever, “Confesso que li, estudei ou sonhei”, mas de vida tenho muito pouco. Vi passa-la pela janela, como a sempre agradável paisagem de quem viaja num comboio.
Vocês sabem que a vida é deslumbrante para quem a vê de fora? Não temos acesso ao todo, mas só ao que parece, ao que é possível de ser mostrado. A parte essencial é varrida para debaixo do tapete, salvando as aparências.
Um dia parti por aí à procura de saber como era a vida real. Como seriam postos em prática os romances que li, os poetas que bebi com sofreguidão. Queria saber, mesmo que por fora, de longe, como era a vida que eu via passar na minha janela com vistas para o mundo.
Não imaginam como é fácil obter respostas quando se sabem fazer as perguntas certas, quando se orientam as conversas no sentido desejado. Não, não é manipulação, é desejo de conhecimento e para se chegar ao saber, os fins justificam os meios, defendo eu…
É muito fácil dizer para quem se sabe nunca vir a encontrar, o que nunca se diria a um amigo, ou ao que poderíamos ver ao dobrar da esquina. As pessoas falam de como vivem, das expetativas goradas, de vidas sem interesse, abandono, falta de diálogo.
Foi um choque. Salvo raras exceções, muitos raras mesmo, só conheci pessoas desiludidas com a vida. O retorno foi muito diferente do que eu esperava.
Mulheres admiráveis, que não pediam mais para ser felizes, que atenção e um pouco de carinho. Que se sentissem importantes. E infelizmente perderam-se num mar de desilusões.

- j a godinho -

segunda-feira, março 25

O que dizem os meus olhos



Parece ser um tema algo narcisista, mas não é, de maneira nenhuma. Eu raramente me vejo ao espelho, e mesmo que o fizesse, os meus olhos não me diriam nada de novo, a não ser a banalidade de ser eu, o hábito.
Por isso, para me conseguir caracterizar, procuro-me na imagem que os outros me devolvem, porque é nos outros que devemos procurar o nosso “eu”.
É a única maneira que temos de saber de nós, saber como os outos nos veem. Essa ideia do auto conhecimento não me diz nada, esto convicto que não passa de um enorme disparate.
Noutros tempos, os meus olhos falavam de tristeza e medo, tinha muita dificuldade em cruzar o olhar com alguém. Quando era impossível de todo fugir, adotava um olhar arrogante, de desafio, muito insolente. Acredito hoje que o fazia como defesa, as pessoas que se sentem debilitadas e que não cedem à humildade, fazem-no sempre. Não sei se os outros o entendiam assim, quando nem mesmo eu sei porque o fazia.
Hoje tudo é diferente, mudei, como não podia deixar de ser, não podemos fugir ao tempo. Vou recebendo notícias dos meus olhos, a imagem que os outros me fazem chegar.
Hoje são calmos e confiantes, a maior parte das vezes, sinal de pessoa resolvida, de bem consigo. Por vezes dizem-me que ficam duros e eu sei que é verdade, sou demasiado exigente com os outros, mas comigo também.
Adoto um olhar interessado, principalmente quando as pessoas novas me dizem alguma coisa.
Já me disseram que tenho olhar de menino mimado, quando por algum motivo faço birra. Também tenho olhares privados, com nome, que só pertencem a uma pessoa. Mas o mais constante é o olhar irónico.
Se os olhos são o espelho da alma? Não! Ou eu teria tantas almas, quantas as pessoas que olho.

- j a godinho -

sexta-feira, março 22

Porque mudamos nós?



Não me agrada muito este “nós”, eu com o tempo estou cada vez mais individualista, só me apetece falar do “eu”, nem o “nós” majestático me seduz.
Porque mudei eu, perguntam-me. Talvez para ficar mais igual ao que sou, relativizar o amadurecimento interior, com a idade física.
Conheço pessoas que não sabem fazer esse trajeto, homens que se tornam garotos velhos e ridículos, ou mulheres que escondem as rugas deliciosas sob camadas absurdas de betume cosmético. São pessoas que envelheceram sem perceberem.
Eu mudei muito. O engraçado é que dou por mim muitas vezes a pensar que poucas pessoas perceberam isso. Os que me conheceram antes, continuam a ver-me da mesma maneira, provavelmente nunca vão descobrir o “eu” de hoje. As pessoas catalogam muito facilmente os outros, depois esquecem, estão demasiado ocupadas com próprio umbigo, para se aperceberem do que se passa á volta. É verdade que eu também estou pouco interessado em chamar-lhes a atenção, seja por vaidade, birra, ou falta de interesse, mesmo. A verdade é que pouco me dizem as gentes pouco atentas aos outros. São poucas as amizades anteriores que transportei para o hoje.
Para os que só conheceram o eu atual, por vezes falo do passado, para que me consigam entender hoje, desculpar as minhas manias e os meus medos.
Eu mudei, sim mudei de uma maneira muito singular. Não o fiz espaçado no tempo, como uma evolução normal. Eu estagnei, passei com que um período de hibernação, um tempo de marasmo onde não me aconteceu nada. Passei anos no escuro da minha toca interior e saiu o outro. Durante tempos não me apercebi de ter mudado, de ver as coisas por outro angulo. Mas um dia, não sei precisar quando, eu era outro e comecei a entender o mundo.

- j a godinho -

quinta-feira, março 14

És o pai da criança



No meu jeito de ser e, consciência imperfeita, uso os sentidos com apuro.
Assim, te conheci.
Meti o nariz onde não era chamada, talvez sim!
Vou vendo, lendo e sentindo, e, não dizendo nada, mas há sempre um dia que não aguento, não suporto e, por dá cá aquela palha, comento! Indignada, irritada, por amor ou saudade, por ausência ou presença, tanto faz, foi o meu sentir, mais nada! E catrapás, já está!
Passei as estribeiras, nunca o saberei! Mas agora, não há volta a dar!
Vendo eu tal poste, não dava, devia de estar saturada...
É aqui neste planeta que nos temos de amar, como se diz que Jesus amou!
É aqui que nos temos de saudar como Deus nos criou!
É aqui! Percebam de uma vez, por favor!
Eu também tenho saudades dos que já partiram desta forma corpórea.
Também tenho quem tenha cancro e doenças sem fundamento, erros genéticos.
Mas partilhar esse eterno estado de pena e saudade não leva a nada! Bem, no fundo leva! Leva a que eu fique triste. Se calhar foi isso, estava já triste nesse dia! E quem cantava o amor de forma tão suave e deliciosa, postar saudade não me caiu bem! O amor nunca morre, transforma-se talvez, mas fica, mesmo na forma mais odiosa.
Ora, foi assim...
Palavra indelicada, puxa palavra indelicada, ou delicada ...
Conversa barata, puxa conversa barata, ou até tem muito que se lhe diga...
Foi numa pressa qualquer que me foi dito, escreve para mim.
Outra burrice sem fim! Mundo este cheio das contradições da Bíblia! Não há hipótese... a crença é toda igual, em qualquer parte deste horrível planeta, que, tal como muitas pessoas, só é bonito visto ao longe, e por fora, quem está dentro, nem sempre tira tanto prazer assim! Sim, já li a bíblia, e recomendo! Depois pode ir ler a Tora, o Alcorão, e outros assim, só muda o nome e a disposição das letras. A essência está lá!
Ao fim de algumas lutas, minhas, lá acedi, no tradicional do meu estado de mau-humor!
Escrever por encomenda não é para mim! 
Sim! Lembro-me de uma amiga que chega ao pé de mim e diz-me: Tens de escrever qualquer coisa que acompanhe as flores para o enterro do pai da Madre Superior!
Nesse dia, só me apetecia rir! Esse dia, vem-me sempre à memória! Lá escrevi!
Ora, então, no meu estado prático questiono o que pretende. Conto. Conto? Eu não sei nada disso!

Nunca me justifiquei, mas o meu escrever é trafulha, é como falo em qualquer que seja a altura, raramente emboneco o que quer que seja, simples, fácil, rápido e despistado, vem mesmo a jeito, e, dá-me um prazer que nem queiram saber! Escrever certinho só para reclamar! Ver a qualidade e a quantidade de letras, não tenho nem paciência!
Escrevi uma coisa qualquer! Uma história rebuscada da memória! A pensar, ufa!, desta vou-me safar, não vai gostar! Nunca o tinha feito antes!
Por isso, hoje, te digo és o pai desta criança!

(Matilde Rosa)

Nota do editor: Eu não pago pensão de alimentos sem antes fazer o teste.

quinta-feira, março 7

O FECHAR DE UM CÍRCULO



Mudar de casa, mudar de cidade e de certo modo mudar de vida.
Criar outras rotinas, procurar novos sítios…
Estou a viver na mesma Rua de onde saí há já 9 anos. Nove anos!?
Mais um círculo se traçou nesta minha vida já velha: Começou no Porto na Rua---- e passando por Espinho acaba na mesma Rua--- no mesmo passeio, 10 números mais abaixo-
Um círculo que se fecha depois de muitas coisas acontecerem, aprendi a dar valor a mim mesma e muita coisa aconteceu, coisas que nunca imaginaria que me pudessem suceder.
Coisas boas, muito boas aconteceram. A descoberta de mim mesma” Afinal sou capaz”, enfim…
Acabei o 12º. Ano, que orgulho, com 66 anos, comecei a escrever incentivada por bons amigos que tenho guardado no meu coração.
Conheci em Espinho Gente.
Gente; Pescadores, vareiras, varredores de rua, homens sem-abrigo. Mas Gente. Quem nunca tropeçou na vida que atire a primeira pedra.
Fiz muitos amigos (as), também Gente, a quem trato por irmãs e irmãos de coração até “filhas e netos” eu achei, nossos corações batem em uníssono, ao mesmo compasso e respirando e vivendo a mesma maneira de estar na Vida.
Levo daqui 9 anos cheios, plenos de tudo onde soube o que era a dor física e o sentimento de um fim próximo, mas… onde aprendi a ser “ mulher de corpo inteiro, uma guerreira”
Do ser autómato, amorfo que durou quase 15 anos. Passei a um Ser pensante, com personalidade e a saber o que quer da vida.
O círculo está prestes a fechar, mas o que fica dentro dele é de tal maneira precioso e intenso que não poderá jamais voltar a sair,
Tem que continuar dentro do círculo e dentro de mim-
Uma nova estrada se abriu… esta vai dar ao Infinito.
Sei que a tenho de lavrar, adubar semear flores e plantar Rosas e letras para colher palavras e com elas tentar escrever prosas ou poesia. Ser EU. O EU que nunca tinha saído de dentro de mim…
Sou guerreira pelos meus ideais.
Sou aventureira nas minhas conquistas.
Sou louca no meu querer e no meu amar.
Sou um Ser. Um Ser pensante com vontade própria.

Maria Helena (03.03.2013)