quarta-feira, junho 1

Vidas Simples II

Esta minha história é toda verdadeira e ocorreu por volta de 1915 em Seda. Pese embora nenhum interveniente ser vivo, optei por alterar os nomes.

A dona Capitolina viveu um grande e curto amor. Mas mesmo assim quando o marido lhe morreu de uma morte muito triste, deixou-lhe oito filhos, cinco rapazes, (dois já casados) e três meninas.
Naquela altura começava-se a trabalhar muito cedo, os rapazes de “ganhão” e as raparigas na “monda”. Algumas meninas começavam a trabalhar de terna idade em casa dos lavradores e não poucas eram despedidas depois de servir os baixos instintos de patrões, filhos, ou feitores lacaios.
Uma das filhas da nossa viúva, a Margarida, (as outras ainda estavam em casa), trabalhava no prédio do maior proprietário rural da terra. Dono de herdades, gados e vida de pessoas. Era ele quem na terra decidia quem tinha direito ao “pão-nosso de cada dia”. Nesses tempos no Alentejo profundo, trabalhava-se os dias todos e comia-se quando era possível. Não se podia afrontar um destes senhores, que eram saudados de chapéu na mão e cabeça baixa.
Um dia a Margarida chegou a casa muito chorosa. Ante as perguntas da mãe, contou que “o filho do patrão, (um rapazola de dezoito anos), a tinha agarrado e tentou fazer com ela algo muito feio, por sorte tinha conseguido escapar”.
Depois de ouvir o relato a viúva fez o que era usual, reunir toda a família e decidir. Mandou as duas filhas mais novas chamar os irmãos casados, ainda nesse dia iam decidir o que fazer como faziam sempre desde a morte do marido.
Á noitinha, depois da ceia, estava reunido o Conselho Familiar. Eles usavam já sem o saber o “et pluribus unum”. A menina e a mãe falaram, retiraram-se e os cinco homens decidiram; “nunca mais se falar nessa história e a rapariga amanhã vai trabalhar para o rancho, já tem bom corpo”.
O triste caso esqueceu-se como os homens tinham mandado e a vida continuou como sempre, mansamente.
Frente ao prédio do lavrador, vivia um dos ferreiros da terra. Era um homem evoluído e interessado na política conturbada da época, feita de revoluções e mudanças de governo constantes dos anos que se seguiram á implementação da República.
Todos os serões o rapazola atravessava o medonho negrume da rua, para participar nas tertúlias em casa do vizinho.
Numa noite muito escura, sem luar, mal fechou a sua porta, foi rodeado por cinco vultos de capote e chapéus pretos. Gritou por socorro, os vizinhos assomaram-se aos postigos, mas nenhum se atreveu a ir em seu auxílio. Levou a maior sova da vida dele, esteve quinze dias entre a vida e a morte.
Durante dias falou-se da afronta feita a um patrão tão importante. Jurava-se a pés juntos ter sido façanha de gabirus de passagem, que ninguém da terra se atreveria a tanto. Mas quem foi mesmo nunca se soube, até desaparecer na bruma do tempo.

O senhorinho nunca relacionou o efeito com a causa, tanto que continuou pela vida fora a abusar de mocinhas inocentes. Mas pela Margarida, pagou bem pago.

3 comentários:

  1. O senhorinho apanhou...e não aprendeu...
    As histórias de maldades dele continuou...

    As maldades do homem... evoluiram e aumentaram...não temos controle...
    Todos os dias ouvimos histórias de terror...
    Crimes cometidos por crianças, adolescentes, jovens, adultos e até idosos com idade bem avançada...
    Incrível !!!
    Todos... com cara de anjos...
    Livres de suspeitas...
    Crimes bárbaros como: pedofília, homicídios, roubos, tráfego de drogas,lavagem de dinheiro,estelionatos...
    Nossa!
    Não tem fim o tanto de maldade que existe...
    Todos os dias ouvimos histórias de terror no mundo inteiro...

    Que triste a publicação de hoje...
    Me fez lembrar do mal que muitos estão a praticar...em nosso tempo presente...
    Dá até medo na gente...

    SÓ DEUS...PARA NOS PROTEGER !!!

    Luciana Ribeiro :(

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  2. Família boa essa.

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  3. Maria, que económica em palavras.
    Mas é muito bom ter-te aqui-

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