sábado, novembro 24

10 – Cem escudos «Luar dos Dias»



Eu queria escrever um conto, juro que queria. Mas não consegui, ficou tão curto que não lhe podia chamar mais que cem escudos. Escrito com uma mistura de raiva e despeito, que já passou, em Setembro/2011.

Cem escudos

Ela era uma mulher afirmativa, já em menina o fora. Grávida de certezas, com o rei na barriga, soube sempre conduzir a vida alheia, a sua, perdeu-lhe o mando e ficou só. Tarde triste, uma viela fria e húmida, ela caminha com os ombros pesados de desilusão. A vida que parecera promissora em tempos idos, muito idos, tinha-se encarregado de lhe levar os sonhos; e o que restava era um futuro em que já não acreditava. Ia ensimesmada em negros pensamentos sobre o que o provir lhe reservava, quando reparou num vulto estranho perdido junto ao regato que fazia a escorrência dos beirados.
Baixou-se, num gesto automático, apanhou-o, sacudiu-lhe a água e meteu-o na mala, sem chegar a perceber porque o fez. Talvez porque a vida tinha deixado de fazer sentido e já nem os seus actos, percebia.
Esqueceu o achado na mala jogada no sofá castanho da sala e dedicou-se a tarefas de mais um serão de dona de casa diligente. Tê-lo-ia mesmo esquecido, não fora a cama larga, a noite longa, e aquela nova espécie de inquietação que a solidão traz consigo e que nasce dentro das entranhas.
Correu a buscar a mala, abriu-a e retirou um pequeno estojo de couro que continha um Massajador facial. Sorriu ante a surpresa, mas deitou-o na cama e ficou longos minutos a contemplá-lo e a pensar.
Ainda nessa noite, lavou-o, desinfetou-o, tricotou-lhe um casaquinho de lã e deixou-o na gaveta da mesinha de cabeceira.
Depois, sonhou que era seu marido e se chamava “omem”. Ela, que nunca conheceu um homem com “h”.

- j a godinho -

1 comentário:

  1. Uai...um curto longo?

    Quando acaba...faz-nos refletir...

    Massageador que no sonho vira um homem?

    Uma mulher que nunca teve um homem,

    sonhar com um marido e chamá-lo

    de "omem"???

    Um massageador seria um belo "HOMEM"

    Não é um conto, mas vou contar tudo...

    Quem mandou contar-me

    Agora eu conto...

    Um conto

    Que vou lembrar...

    Vou pensar...

    E porque não contar...

    Contá-lo-ei e pronto.

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