Um caso
óbvio de falta de calo.
Uma história antiga
Era
um dia quente de final de Maio de 1974, e sei que era sexta-feira. Naquela
manhã, à chegada ao Externato Diogo Mendes de Vasconcelos, Alter do Chão, fomos
todos convocados pelos mais velhos para a “Sala da Mocidade”, (nome pomposo
para um retângulo com armários nas paredes e uma desconjuntada mesa de
ping-pong).
Não
queriam ter aulas ao sábado, anunciá-lo ao diretor e se a reivindicação não
fosse aceite, partir para a greve. Já estava tudo decidido. A nós, os mais
novos, só nos restava segui-los, sob pena de levar uns “carolos” recusando-nos.
E
lá fomos todos em bando para o gabinete do diretor, o senhor Padre Zé Maria
(uma excelente pessoa). Lá chegados, alguém expôs a nossa (deles)
reivindicação, sem esquecer de aludir à ainda terrível ameaça para aqueles
tempos, a greve…
Recordo
o ar divertido do diretor. Era para ele uma novidade, e inconcebível que um
bando de fedelhos ousasse interpelar um respeitadíssimo representante de deus
na terra. Naqueles tempos não era hábito misturar as águas. Um padre
cumprimentava-se de cabeça baixa e chapéu na mão. E se alguém ousasse
desrespeitar o costume, lá estava a GNR para o castigar. Muita coisa se
resolvia com uma boa sova no Posto.
Então
eu ouvi o Padre Zé Maria dizer-nos com um ar paternalista:
-
Mas o que é isto? Guerra entre patrões e criados? Quem é aqui quem?
Fez-se
um silêncio infindável. Naquela altura, os responsáveis pela baderna, já tinham
recuado e deixado a frente da luta aos miúdos. Eu estava no meio da sala e
ouvi-me dizer:
-
Senhor diretor, não é uma questão de patrões e criados. Mas a haver patrões,
somos nós. Nós é que pagamos.
O
homem fez-se de todas as cores ante a afronta. Apontou-nos a porta da rua, e
para as aulas já!
Depressa
aconteceu a total desmobilização. Aliás os instigadores foram os mais lestos a
obedecer. Ficámos 4 ou 5 em greve. Suficientemente poucos, para ser possível
chamar os pais. O meu pai chegou de motorizada por volta das 2 horas e disse o
óbvio:
-
Eu pago para estudares, não p’ra fazer greves. Já p’ra aula.
Não
havia volta a dar. Subi a escadaria, bati à porta da sala grande, aula de
história da Dona Mabília e pedi licença para entrar. Olhei para os meus
colegas, e com uma terrível vontade de chorar, disse:
-
Estou aqui porque fui obrigado.
E
assim terminou, sem honra nem glória, o meu primeiro ato político.
-
j a godinho -
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