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“ AVÔ CHICO I “ -----
Quem tem a sorte de ser alentejano,
percebe a importância das alcunhas, a maneira como elas se colam às pessoas, ao
ponto de algumas vezes serem incluídas no nome e se estenderem por gerações.
O meu avô Francisco Botas Bernardino, (o
Malarranha), nasceu por volta de mil e novecentos, atravessou todo o período
revolucionário da implantação da república, sucessivos governos e golpe de
estado fascista que proclamou o Estado Novo. Ganhou a alcunha por em criança
ter vivido com os pais numa freguesia a uns quarenta quilómetros de Seda, a
Malarranha. Quando voltou, correu a notícia entre as crianças amigas, “chegou o
Chico, da Malarranha”, daí até o nome colar e ser mais tarde transmitido aos
filhos, foi um ápice.
Já o conheci, o outro, mas a minha avó
muitas vezes me contou a história do marido, que nem os filhos conheceram.
Era um homem alto e seco, o mais velho
dos irmãos ouriços, lia e escrevia sem nunca ter frequentado a escola e durante
o tempo de solteiro, só trabalhava nos serviços mais difíceis, portanto os mais
bem pagos. Nunca trabalhava na segunda-feira, ficava a acompanhar os amigos
“alcagoitos”, (os que não labutavam no campo; comerciantes, sapateiros,
alfaiates, correeiros, etc) e nesses dois dias, (domingo e segunda), usava fato
completo e uma corrente de ouro a prender o relógio. (essa corrente, relíquia
de família, esteve em minha casa até fim dos anos noventa, a minha avó suportou
muitos anos de fome, mas nunca se desfez dela).
Crescendo nesse caldo de revoluções, como
ao invés da esmagadora maioria, tinha acesso à informação, tornou-se um
ferrenho republicano. Em vinte e nove, quando casou, não quis ir à igreja, fez
só um casamento civil.
Nessa época os padres eram autênticos
rafeiros do latifúndio, (hoje pouco mudaram), viviam dos restos que caíam da
mesa dos ricos e dessa coisa nojenta, a congra, que roubavam aos pobres com a
ameaça do fogo do inferno. Aproveitavam-se dos que eram ainda mais ignorantes
que eles.
A minha mãe nasceu em 1930 e menos de
dois anos depois, o meu avô começou a perder a memória. Uma sifles contraída na
juventude e mal curada, começou a atacar-lhe o cérebro.
Gostei Muito. Fico à espera de mais!
ResponderEliminarBjs.
M.M.