Uma história
familiar verdadeira, Maio/2011.
Justiça
Dona Capitolina
viveu um grande e curto amor. Mas mesmo assim quando o marido lhe morreu de uma
morte muito triste, deixou-lhe oito filhos, cinco rapazes, (dois já casados) e
três meninas.
Naquela altura
começava-se a trabalhar muito cedo, os rapazes de “ganhão” e as raparigas na
“monda”. Algumas meninas começavam a trabalhar de terna idade em casa dos
lavradores e não poucas eram despedidas depois de servir os baixos instintos de
patrões, filhos, ou feitores lacaios.
Uma das filhas
da nossa viúva, a Margarida, (as outras ainda estavam em casa), trabalhava no
prédio do maior proprietário rural da terra. Dono de herdades, gados e vida de
pessoas. Era ele quem na terra decidia quem tinha direito ao “pão nosso de cada
dia”. Nesses tempos no Alentejo profundo, trabalhava-se os dias todos e
comia-se quando era possível. Não se podia afrontar um destes senhores, que
eram saudados de chapéu na mão e cabeça baixa.
Um dia a Margarida
chegou a casa muito chorosa. Ante as perguntas da mãe, contou que “o filho do
patrão, (um rapazola de dezoito anos), a tinha agarrado e tentou fazer com ela
algo muito feio, por sorte tinha conseguido escapar”.
Depois de ouvir
o relato a viúva fez o que era usual, reunir toda a família e decidir. Mandou
as duas filhas mais novas chamar os irmãos casados, ainda nesse dia iam decidir
o que fazer como faziam sempre desde a morte do marido.
Á noitinha,
depois da ceia, estava reunido o Conselho Familiar. Eles usavam já sem o saber
o “et pluribus unum”. A menina e a mãe falaram, retiraram-se e os cinco homens
decidiram; “nunca mais se falar nessa história e a rapariga amanhã vai
trabalhar para o rancho, já tem bom corpo”.
O triste caso
esqueceu-se como os homens tinham mandado e a vida continuou como sempre,
mansamente.
Frente ao prédio
do lavrador, vivia um dos ferreiros da terra. Era um homem evoluído e
interessado na política conturbada da época, feita de revoluções e mudanças de
governo constantes dos anos que se seguiram á implementação da República.
Todos os serões
o rapazola atravessava o medonho negrume da rua, para participar nas tertúlias
em casa do vizinho.
Numa noite muito
escura, sem luar, mal fechou a sua porta, foi rodeado por cinco vultos de capote
e chapéus pretos. Gritou por socorro, os vizinhos assomaram-se aos postigos,
mas nenhum se atreveu a ir em seu auxílio. Levou a maior sova da vida dele,
esteve quinze dias entre a vida e a morte.
Durante dias
falou-se da afronta feita a um patrão tão importante. Jurava-se a pés juntos
ter sido façanha de gabirus de passagem, que ninguém da terra se atreveria a
tanto. Mas quem foi mesmo nunca se soube, até desaparecer na bruma do tempo.
O senhorinho
nunca relacionou o efeito com a causa, tanto que continuou pela vida fora a
abusar de mocinhas inocentes. Mas pela Margarida, pagou bem pago.
- j a godinho -
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