Pelas minhas contas, terá nascido por volta de 1865, chegado a Seda em 1877, era “pechardeco”, natural de Chança e veio trabalhar como “moleque” para casa dos Teixeira (moleque era uma espécie de moço de recados das casas ricas). O primeiro trabalho dum menino antes de chegar a ganhão). Chamava-se António Lourenço, e foi meu bisavô materno.
Por lá conheceu uma criadita, afilhada da casa, chamada Catarina Rosa. Acabaram de se criar juntos e desenvolveram uma antipatia mútua, de todos conhecida, que só terminou quando ela já não podia mais esconder a barriga. Os patrões casaram-nos à pressa, o mal já não tinha remédio e foram pais de oito filhos, cinco rapazes e três raparigas. O meu bisavô era reconhecido na terra como um excelente trabalhador e uma pessoa muito honrada. Era hábito por aqui haver também uma certa deferência por quem tinha vindo de fora.
O ano de 1908 foi de uma grande invernia. Não era possível trabalhar nos campos e lá em casa havia dez bocas famintas. Convencido pelos vizinhos, acompanhou-os uma noite a apanhar uns quilos de bolota, (bolêta). Era um terrível crime nesses tempos no Alentejo, um pobre matar a fome com o que estava destinado aos porcos.
Ele não voltou nessa noite. Perguntados em segredo os companheiros do “roubo”, nada de nota tinha acontecido.
Fizeram o percurso no sentido inverso e encontraram-no. Ao tentar saltar um ribeiro, não alcançou a outra margem. A água gelada, o peso do saco e a correnteza, mataram-no.
Por lá conheceu uma criadita, afilhada da casa, chamada Catarina Rosa. Acabaram de se criar juntos e desenvolveram uma antipatia mútua, de todos conhecida, que só terminou quando ela já não podia mais esconder a barriga. Os patrões casaram-nos à pressa, o mal já não tinha remédio e foram pais de oito filhos, cinco rapazes e três raparigas. O meu bisavô era reconhecido na terra como um excelente trabalhador e uma pessoa muito honrada. Era hábito por aqui haver também uma certa deferência por quem tinha vindo de fora.
O ano de 1908 foi de uma grande invernia. Não era possível trabalhar nos campos e lá em casa havia dez bocas famintas. Convencido pelos vizinhos, acompanhou-os uma noite a apanhar uns quilos de bolota, (bolêta). Era um terrível crime nesses tempos no Alentejo, um pobre matar a fome com o que estava destinado aos porcos.
Ele não voltou nessa noite. Perguntados em segredo os companheiros do “roubo”, nada de nota tinha acontecido.
Fizeram o percurso no sentido inverso e encontraram-no. Ao tentar saltar um ribeiro, não alcançou a outra margem. A água gelada, o peso do saco e a correnteza, mataram-no.
Mas quem realmente o matou, foi a fome.
Assim terminou a curta história do meu bisavô “pechardeco".
Assim terminou a curta história do meu bisavô “pechardeco".
Afinal tu tens uma"costela de pchardeco"...!
ResponderEliminarA curta história do teu bisavõ, infelizmente terá sido uma entre tantas outras.
Apesar dum final trágico, não deixa de ser uma bonita história, contada por um bisneto do qual o
seu bisavô muito se orgulharia.
Antes do seu nascimento, já tinhas algo a compartilhar conosco, não é por acaso que tens o talento de escrever, acabei de crer.
ResponderEliminarNão sei ainda o que é um "pechardeco", apesar de desde pequeno sempre ouvir esse termo, referindo-se a uma familia com esse apelido. Por aquilo que dizes, também eu terei uma "costela".
ResponderEliminarMais, tenho o nome do bisavô, que nunca conheci.Penso que nem a bisavó!
Não sei onde vais "buscar" estas histórias mas, adoro ouvi-las. Conta mais, conta mais.
Abraço
BFS
Meu Caro
ResponderEliminar"Pchardeco" é um natural de Chança.
E as histórias, contava a nossa avó.
Acabei de ler a tua "história" e tenho que te dar os parabéns pela forma como transmitiste em meia dúzia de linhas, uma realidade, embora distante, mas carregada de simbolismo, de sentimentos, emoções, com um final triste e sentido. Que melhor forma de descrever a vida, uma vida, com todo um percurso, que inclui a morte, parte integrante dessa mesma vida! Retrataste como ninguém, a fome, a miséria e a luta pela sobrevivência. E quando o autor consegue passar a sua carga emocional, para o leitor e não o deixa indiferente, eis o verdadeiro escritor...Parabéns
ResponderEliminarJoaquim Malheiro
Obrigado amigo Malheiro, faz-se o que se pode.
ResponderEliminarCaro contador de histórias, e como te define o amigo Joaquim Malheiro, com alma e coração, obrigado por esta narrativa que nos recorda os momentos difíceis pelos quais os nossos antepassados passaram e a dura realidade da época. Fico muito sensibilizado o final trágico da história que não conhecia. Corrige-me se estiver enganado, mas o António Lourenço era pai do meu avó José Maria Lourenço, e por conseguinte também meu bisavô. Um abraço
ResponderEliminarZé Zacarias
Era mesmo, amigo Zé.
ResponderEliminarUma história de vida relativamente comum nesse tempo,ir às escondidas apanhar umas míseras migalhas para enganar a fome aos filhos. Desta vez com um fim trágico o que deve ter deixado ainda mais em apuros toda a família. O relembrar destas histórias pode servir para que os mais jovens tenham conhecimento que,ainda há bem pouco tempo, a luta dura pela vida não era apenas tema de filmes, era uma realidade dolorosa.
ResponderEliminarFernando Sousa