Todos os anos, normalmente em meados de Junho, recebemos a visita,
indesejada, dos estorninhos pretos. É o primeiro sinal para a campanha dos
figos que se avizinha.
O estorninho preto (Stumus
unicolor) é uma ave da família “Sturnidae”. Carateriza-se pela plumagem preta
reluzente com bico amarelo e patas vermelhas e têm uma especial apetência por
figos.
Logo que nas figueiras começa a aparecer a primeira camada de figos
lampos aí estão os estorninhos prontos para o ataque.
A técnica utilizada para o furto dos figos não tem variado de ano para
ano. Aparecem logo pela manhã, primeiro em pequenas esquadrilhas, que
certamente, são incumbidas de proceder ao necessário reconhecimento dos locais
a invadir e depois em grandes grupos para o indispensável combate.
Logo que o sol começa a raiar, em cada dia, é vê-los a pousar, na
vertical, no alto das figueiras armados de compridos bicos amarelos e garras
afiadas, transformando a paisagem verde das figueiras num inesperado manto
preto luzidio.
Têm, ainda assim, a particularidade de alertar os habitantes da
proximidade, tal a algazarra que fazem, após chegada, antes do trabalho prestes
a iniciar. Daí a poucos minutos estão picados todos os figos inchados e maduros
que, em seguida, são derrubados por estes intrusos.
A receita tradicional para o afastamento destes indesejados visitantes
consta de: batuques em latões, ventoinhas que rodam e fazem barulho com o
vento, panos colocados na ponta de canas à altura das figueiras ou bonecos
simulando figuram humanas vestidas a preceito com chapéus de palha e vestuário
de cores garridas.
Recentemente, fruto das novas tecnologias, os donos das figueiras têm
recorrido a objetos reluzentes: DVD e embalagens vazias de acondicionamento de
líquidos, entre outros materiais desconhecidos destas aves.
A resposta mais eficaz contra a presença destas indesejadas criaturas
seria uma produção tão abundante de frutos que chegasse para lhes saciar a fome
e os seus instintos agressivos, coisa que não está ao alcance dos produtores e
que a Natureza este ano se encarregou de contrariar.
Uma atitude mais radical, não aceite pelos defensores desta espécie,
seria a utilização de armas de caça que serviriam para os afugentar e, também,
para defesa pessoal de gente idosa que se encontra isolada em montes,
principalmente no Alentejo e Algarve, solução muito difícil de concretizar do
ponto de vista legal.
Assim, àqueles que persistem em cumprir escrupulosamente a lei, não
lhes resta outra alternativa que não seja a de procurar outras formas
inovadoras de afastar estas dispensáveis criaturas sob pena de nunca chegarem a
provar o fruto das suas figueiras.
Este ano tentei, até agora, com resultados francamente positivos,
dar-lhes música que não fosse do seu agrado.
A partir de um rádio, escondido
no interior de uma figueira, ligado à corrente elétrica, comecei por sintonizar
o aparelho em estações que, transmitem, regularmente, música e canções em
inglês das que estão a fazer sucesso em Portugal.
As aves, nos primeiros dias, aproximavam-se do objetivo, estranhavam a
música, efectuavam voos rasantes mas não pousavam nas árvores, desaparecendo em
seguida para não voltarem ao local. A última vez que os avistei aproximavam-se
do Crato onde, provavelmente, tentarão matricular-se em inglês, situação que só
poderá ocorrer após a concretização da anunciada alteração do paradigma das
Novas Oportunidades.
Informei, então, os outros habitantes da casa de que aquele rádio não
deveria ser ligado noutros emissores, enquanto durasse a campanha dos figos.
Estava encontrada a solução. Trata-se de aves naturais e residentes no
nosso território que demonstraram possuir desconhecimento e receio da música
inglesa, pelo que o pessoal poderia, desde já, comer figos de qualidade,
isentos de qualquer bicada e com a vantagem de não terem de ouvir música
“pimba” durante o Verão.
Seda 15 de Agosto de 2012
(João Aurélio Raposo)
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